O armário dos empreendedores corporativos

Paira no ar um certo antagonismo entre o mundo das startups e o mundo corporativo. De um lado, os empreendedores: pessoas criativas, com T-shirts negligé, que trabalham em coisas cool; do outro, os executivos: pessoas com pouca imaginação, bem vestidas, que trabalham em coisas aborrecidas.

Mas serão mundos assim tão diferentes? Será que nas organizações maiores não existem pessoas com ganas de levar boas ideias para a frente? Será que as grandes empresas não podem absorver algum espírito e, sobretudo, as boas práticas das startups, criando condições que permitam aos seus empreendedores internos sair do armário?

Eric Ries diz que sim e eu não poderia estar mais de acordo. No seu primeiro livro - The Lean Startup -, Eric define uma série de conceitos e de processos que, quando bem implementados, levam as startups ao sucesso (ou levam a que falhem mais rapidamente, desperdiçando menos tempo e dinheiro), uma metodologia há muito utilizada por empresas como o Facebook, a Amazon, o Airbnb e que passa sobretudo por:

- Apostar na experimentação em vez de perder tempo com estimativas elaboradas (as pessoas são ótimas a explicar os seus atos passados e péssimas a prever os seus comportamentos futuros).

- Deixar de lado a intuição e focar no feedback real dos clientes com a ajuda de MPV (mínimo produto viável, no fundo, a forma mais barata e mais rápida de conseguir testar um novo produto ou serviço em clientes reais).

- Implementar o ciclo construir-medir-aprender em loop constante, até que o conjunto das aprendizagens produza resultados.

Esta metodologia Lean Startup despertou o interesse dos empreendedores (um milhão de livros vendidos, uma espécie de bíblia das startups) mas também chamou a atenção de alguns gigantes, tais como a General Electric e a Toyota, que rapidamente contrataram Eric Ries para consultor, lançando-lhe o seguinte desafio: "E agora, senhor Ries, como é que implemento esse modus operandi das startups na minha multinacional?"

No seu segundo livro - The Startup Way -, Ries descreve essa experiência e deixa conselhos válidos para qualquer tipo de organização que queira aproveitar o potencial empreendedor dos seus colaboradores (os tais que querem sair do armário). Eis as conclusões que me parecem mais relevantes:

- Dentro das grandes organizações, o empreendedorismo interno vai evoluir bastante nos próximos anos, a ponto de se tornar uma área tão banal como marketing, recursos humanos ou finanças.

- As empresas vão dar mais oportunidades aos seus recursos para empreenderem novas ideias, permitindo que o façam através de um método rigoroso e não crucificando os falhanços sempre que estes tragam aprendizagens valiosas para a empresa (para isso ser possível, os incentivos e o sistema de avaliação dos colaboradores terão obrigatoriamente de se adaptar).

- Os ciclos de inovação serão contínuos, mais curtos, e realizados por equipas mais pequenas (a Amazon, por exemplo, criou a regra two-pizza team, isto é, se duas pizzas não chegarem para uma refeição de equipa quer dizer que a equipa já está demasiado grande).

"Uma startup é uma instituição humana projetada para desenvolver um novo produto ou serviço sob condições de extrema incerteza." Com esta definição, Eric Ries alarga o âmbito do empreendedorismo e pisca o olho aos gestores das grandes organizações, pois nos dias de hoje qualquer empresa - pequena, média ou grande - tem de saber crescer e inovar num ambiente extremamente incerto.

André Dias, Fundador da startup SnapCity

*Artigo originalmente publicado no jornal Diário de Notícias

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